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Writer's pictureMaria Alice Gadelha

Propósito

Meu pai sempre me ensinou sobre o ato de celebrar as conquistas, não apenas às grandes conquistas, como também e principalmente, às pequenas - Afinal, o que é a vida senão um aparato de fragmentos do cotidiano que, quando somados, formam O Viver? Tem palavra mais bonita que “viver”? Para mim, Viver é sujeito, costumo colocar um artigo antes dele, tornando-se: O Viver.


Na minha infância, eu tive problemas de crescimento e era extremamente magricela. Não me dava bem nos esportes, mesmo depois de numerosas tentativas. Tentei handebol, não deu muito certo… Vôlei? Uma verdadeira frustração, fervia de medo que a bola caísse na minha cabeça e me derrubasse ao chão feito um arremesso de boliche. As meninas do time eram muito mais altas que eu e tinham muito mais força, aptidão. Fiz tênis uma época, mas sequer conseguia segurar a raquete, de tão pesada que era para meus braços finos. Daí não sei onde vi, se havia lido em algum livro ou visto em algum filme, mas a ideia surgiu da minha própria cabeça, no auge dos meus 8 anos, veio à mente de fazer hipismo.


Racionalmente - e olhe que não sou muito - pensei: Se eu não tenho altura, o cavalo terá por mim, se eu não tenho força, o cavalo terá por mim, eu só preciso ser sua mais bem-quista guia. Bem, durante os treinos, vi que não era apenas guiar o cavalo, tinham muitas outras técnicas e era tão difícil quanto os outros esportes, mas ali, naquela hípica de minha cidade, eu não sentia que minha altura ou o meu peso pudessem me impedir de completar um circuito. Pois bem, onde que entra essa história das pequenas conquistas tendo mencionado esse contexto?


Toda vez que eu saia do treino de hipismo, meu pai estava ao lado de fora, com os olhos que brilhavam de orgulho, porque ele sentia o mesmo que eu, via que eu era parte dali. Em um desses muitos treinos, adquirimos um hábito; Perto da hípica que eu treinava tinha um restaurante à beira-mar que nossa família e, principalmente meu pai, amava. O hábito constituía em sair da hípica ao entardecer, cheirando à terra, sentindo à brisa do mar e ir até o tal restaurante, sentar-se à mesa arrumada e pedir uma fatia de torta alemã para comer. Já o meu pai, ordenava uma dose de uísque ao garçom - a depender do dia da semana - ou uma coca-cola. Também nos habituamos a sair dos meus ensaios de teatro e ir até o restaurante japonês preferido da época, para nos deliciarmos com diversos sushis e assim termos tempo para papear sobre teatro, arte, literatura, política e tantas coisas mais.


Meu pai não fazia isto apenas comigo, fez isso com meus outros 3 irmãos. Ele sempre entendeu que não deveríamos esperar grandes ocasiões para que grandes alegrias pudessem germinar. E não somente de restaurantes e afins que celebrávamos à vida, não mesmo! Celebrávamos em casa, comendo algo gostoso, vendo um filme ou com toda família reunida numa mesa, com xícaras de cafés espalhadas, sendo estas as únicas testemunhas de tantas conversas que se delongavam.


Com o passar dos anos, adquiri os meus próprios hábitos para celebrar à vida. No último domingo - cansada da semana como de costume - chamei-me para um passeio na paulista. Comi um hambúrguer que adoro, fui ao IMS (Instituto Moreira Salles), em seguida à uma igreja suntuosa em que fui surpreendida com um coral, que cantarolava músicas definitivamente atemporais. Na segunda-feira, saí de minha aula, cheguei em casa e fui correr no parque, ao invés de ir para casa com o sentimento de dever cumprido por perder algumas calorias, sentei-me a grama do parque e me vi assistindo o cotidiano das pessoas, como num filme, sem me deixar distrair por nenhuma notificação que o celular atentasse. Na quarta, passei toda tarde com uma amiga, encaixotando sua mudança e provando seu prato veggie delicioso.


É preciso pausar a vida para poder sentir o sujeito chamado Viver. Os ouvidos devem estar disponíveis para escutas que às vezes somos displicentes. Os olhos precisam ser oceanos para os entardeceres - sejam esses na Grécia ou no escritório que por vezes sufoca. Os lábios devem desejar a comida que fazemos na mesma proporção que desejamos aquele prato do restaurante 5 estrelas da cidade. O nosso olfato deve sentir prazer na fronha lavada como sente prazer ao vermos nossa pessoa preferida saindo do chuveiro cheirando sabão - agarramos aquela pessoa no mesmo instante. O que você tem agarrado nos últimos tempos? Será que você tem se agarrado? Dado a si o que doa aos outros? Ou nem um e nem o outro?


O clichê funciona bem, a vida é clichê. Por isso que os livros de autoajuda são os que mais vendem na Amazon. São clichês, mas quem não tem um ao lado da cabeceira que atire a primeira pedra - se você não tem, você é muito enfadonho. Veneramos o inalcançável quando o alcançável está ali, bem próximo ao que nos impulsiona.


Recentemente, um amigo me pediu para falar sobre propósito, a propósito, o meu é celebrar O Viver, porque se não vivermos de todo o nosso coração, nenhum objetivo grandioso fará sentido a longo prazo. No fim, não temos ideia de nosso prazo nesse plano, de maneira palpável, só temos o presente momento, que é um acúmulo de planejamentos e afazeres, mas nesse meio tempo, temos alegrias a cumprir.


Dedico este texto à minha cunhada, Keoma e ao meu pai, que muito me ensinaram sobre tudo que foi escrito.


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seu propósito é mto lindo lilice. o simples viver! ver o belo nos detalhes gratuitos da vida.

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