Woody Allen segurou a minha mão e me levou a um sótão escuro, no segundo andar de nossa casa. Ele pediu para que eu deitasse e brincasse com o trem elétrico de meu irmão. Ele, então, me assediou sexualmente.” Palavras de Dylan Farrow, filha adotiva do diretor Woody Allen. Ela tinha apenas sete anos de idade à época.
Woody Allen é reconhecido mundialmente como um diretor de sucesso, haja vista que assinou grandes filmes que foram aplaudidos com fervor na indústria cinematográfica. Contudo, uma cortina costurada a partir de um glamour supérfluo, mas atraente ao público, esconde a parte misógina e subversiva de Allen.
Não é de grande conhecimento público as acusações que vêm ganhando força contra o diretor. Estas acusações se baseiam em histórias de assédio que muitas atrizes deram luz nos últimos tempos. Woody Allen não só assediou sua filha adotiva quando infante, como iniciou um relacionamento amoroso com uma enteada sua, chamada Soon-Yi.
Soon-Yi é filha adotiva da ex-mulher de Woody, Mia Farrow. Mia descobriu o relacionamento dos dois enquanto ambos ainda estavam juntos. Ela encontrou fotos nuas de Soon na câmera fotográfica do então companheiro, de tal modo que passou a indagar com estranhamento a relação dos dois - anteriormente aos fatos elucidados, uma relação paternal, posto que Allen cuidava da menina como uma filha. Soon-Yi se tornou companheira de Woody e está com ele até dias atuais.
Vários jornalistas afirmam que o diretor tem uma fixação por jovens mulheres, pelos seus corpos. Muitos dos roteiros inacabados de Woody, contam histórias de personagens masculinos de meia-idade, que vivenciam casos amorosos com personagens femininas, muito jovens por sinal.
Várias atrizes e diretoras, que fazem parte do movimento “MeToo”, incluindo; Greta Gerwig (Frances-Ha), Ellen Page (Juno) e Mira Sorvino (Mighty Afrodite), escolhem permanecer ao lado da filha adotiva de Mia Farrow e Woody Allen.
O “MeToo” é o nome dado a um movimento contra o assédio sexual, que ganhou força em meados de 2017. O movimento é formado majoritariamente por mulheres, com o objetivo de tornar público os abusos sexuais que muito ocorrem em ambientes de trabalho.
Além disso, Timothée Chalamet e Rebecca Hall, que trabalharam com Woody recentemente, se disseram arrependidos de fazer parte do filme "A Rainy Day in New York”. O filme iria estrear em 2019 nos cinemas do mundo inteiro, porém, com tais acusações contra Woody, acabou só sendo liberado para a Europa. A Amazon, inclusive, cancelou a parceria com o filme.
Ambos os atores acima se recusaram a promover o filme. Timothée, em especial, nova promessa de Hollywood, escolheu doar todo o dinheiro que arrecadaria do filme a três instituições: Times Up, Centro LGBT de Nova York e Rainn (Rede Nacional de Estupro, Abuso e Incesto).
É de dar fúria, ver que, algumas atrizes defendam o diretor. Scarlett Johansson é uma dessas atrizes que lutam a favor da inocência de Woody. Diz ela que acredita piamente em sua versão da história e que estará ao lado dele, que trabalhou junto tantas vezes.
Observar uma mulher que tem tanta força na mídia, esquivando-se a acreditar noutra mulher é assustador. No livro “O Mito da Beleza”, escrito pela ativista da terceira onda do feminismo, Naomi Wolf, tece a filosofia de que, enquanto as mulheres não se unirem em batalhas travadas por elas mesmas, continuarão escravizadas pela indústria da mídia, pela indústria cirúrgica e pela indústria de cosméticos.
As mulheres foram libertadas do que se chama: Mistificação Doméstica. Mas, o sistema patriarcal reinventou outra maneira de tornar as mulheres subservientes a papéis criados a partir de ideais masculinos. É preciso que haja uma união total do feminino para com diversos tipos de abuso contra a libertação das mulheres. Somente assim se conseguirá voz ativa neste sistema tão desigual, que suga não só a alma das mulheres, como também seu físico.
Na série de livros “A Amiga Genial” de Elena Ferrante, há um trecho escrito por Lenu, uma das personagens principais da história, que merece ser evidenciado:
“Para Franco, disse, eu era uma possibilidade dele expandir-se no feminino, de apossar-se disso: Eu constituía a prova de sua onipotência, a demonstração de que sabia não só ser homem do modo certo, mas também mulher. E hoje, que não me sente mais como uma parte de si, se sente traído.”
Vejo que os abusos sexuais, físicos e psicológicos, se iniciam a partir desta premissa de Lenu. Quando um homem não consegue atingir o ideal que esperava a partir do que fosse determinada mulher para ele, ocorre a fúria. A fúria masculina advém de um sentimento covarde, de origem patriarcal, por não alcançar o esperado.
Os homens foram acostumados ao longo de toda a história da humanidade a obterem o que bem quisessem, a saírem vitoriosos numa luta criada por eles mesmos.
Não há mais espaço para se convalescer com tais atitudes subversivas. Estas atitudes não devem ser relativizadas, elas não serão escondidas, não serão varridas para um lugar oculto, não mais! As mulheres não são mais submissas, aliás, nunca deveriam ter sido.
A culpa não é minha, não é sua! Não carregue esta culpa. Este caso de Woody Allen é um alarme para nós, para que não continuemos a normalizar atitudes machistas e ditatoriais.
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